Visita: Estação experimental Aurora

por Cassandro Emer

Introdução

Descrição de visita à Estação Experimental da Cooperativa Vinícola Aurora, situada em Pinto Bandeira - RS.


Figura 1: Vista da propriedade

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Dentro da Estação Experimental situa-se uma estação Metereológica da Embrapa Uva e Vinho, que pode ser utilizada para o georreferenciamento da propriedade. As coordenadas aproximadas da estação meteorológica são: -29,120027199021848 (latitude), -51,4499831199646 (longitude). A altitude é de 730 m do nível médio dos oceanos.

A área visitada foi adquirida pela Cooperativa nos anos de 1978-79. Inicialmente, a proposta da propriedade era a realização de testes de adaptação de variedades Vitis européias, tais como Sémillon, a principal uva da região de Sauternes (França), Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Pinor Noir, Gewürztraminer, Tannat e Riesling itálico.



Figura 2: Placa indicadora no vinhedo

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Por algum período, a área foi alocada a experimentação de produtos agrícolas, atualmente, porém, o propósito dos vinhedos é a produção de uvas diferenciadas que dão origem às linhas de vinhos premiados da Cooperativa Vinícola Aurora. Além disso, a área situa-se dentro da IG (Indicação Geográfica) Vinhos Finos de Pinto Bandeira. Uma área da propriedade é destinada a um ensaio de clones do cultivar Chardonnay, por parte da Embrapa Uva e Vinho (figura 3).



Figura 3: Área do ensaio de clones de Chardonnay

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Figura 4: Espaçamentos 1 m por 2,2 m

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A área é de 24,4 ha, sendo 15,5 ha cultivados. A parcela cultivada é distribuída em nove quadras. Atualmente as principais variedades cultivadas são Riesling itálico, Chardonnay e Pinot Noir. O sentido das linhas em várias das quadras é ESE-ONO, ou seja, lés-sudeste a oés-noroeste, as demais seguem o sentido E-O (leste a oeste).



Figura 5: Diferenciação das folhas de Riesling itálico (e) e Pinot Noir (d)

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Características

Durante a visitação, o engenheiro agrônomo Sr. Bavaresco, da Cooperativa, que cordialmente nos recepcionou e conduziu, abordou diversos aspectos técnicos que afetam a produção de uvas na localidade. Dentre eles, destacam-se:

CONDUÇÃO

O sistema de condução utilizado é espaldeira em toda a área cultivada, sendo a poda em Guyot duplo. O sistema de Guyot duplo é amplamente empregado na região de Bordeaux (França) e baseia-se numa composição de poucos esporões para renovação (usualmente dois) e duas varas, estas últimas conduzidas ao longo do arame em direções opostas. As brotações são conduzidas verticalmente entre pares de fios superiores. O espaçamento empregado é de 1 m entre plantas e 2,2 m entre fileiras, a produção média é de 2 a 2,5 Kg de uva por planta. A figura 6 ilustra a poda em Guyot duplo descrita.


Figura 6: Guyot duplo

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PÉROLA-DA-TERRA

A pérola-da-terra (Eurhizococcus brasiliensis) é uma cochonilha subterrânea que ataca as raízes de plantas cultivadas e silvestres. Durante o diálogo com o engenheiro, percebeu-se a importância do combate à pérola-da-terra, que afeta a produção da área visitada, e é tida como o principal problema de praga in loco. Bavaresco descreveu o emprego do produto Actara, cujo princípio ativo é o tiametoxam, inseticida sistêmico de amplo espectro da família dos neonicotinoides. É importante citar que o tiametoxam foi discutido em 2013 na União Européia, uma vez que publicações demonstraram um potencial risco às populações de abelhas. Das discussões surgiu uma proibição que restringe o uso de imidacloprida, clothianidina e tiametoxam em culturas que atraem abelhas. Portanto, é interessante cuidado na aplicação procurando o combate à pérola-da-terra, já que em muitos casos há cobertura de solo em período de florescimento, tal como trevo branco e nabo forrageiro.


Figura 7: Característica sintomática de presença de pérola-da-terra

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Figura 8: Pérola-da-terra coletada do solo

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Outro aspecto abordado em relação à pérola-da-terra foi a necessidade de um manejo de adubação com valores acima dos usuais, para compensar a infestação do inseto. Dentre as possíveis causas do aumento populacional da pérola-da-terra, Bavaresco citou a série de anos sem incidência de geadas fortes na região, além de invernos pouco intensos.

COCHONILHAS

As cochonilhas também foram mencionadas por Bavaresco. Cochonilhas são insetos que se alimentam sugando a seiva de plantas, podendo serem vetores de doenças e prejudicando o vigor pela retirada de seiva e deposição de enzimas digestivas. As cochonilhas, tais como a cochonilha parda (Parthenolecanium persicae), cochonilha algodão (Icerya schrottkyi) e a cochonilha-do-tronco (Hemiberlesia lataniae) ocorrem em videiras e, muitas vezes, são combatidas com inseticidas a base de piretróides. A questão é que pelo amplo espectro do efeito de piretróides, este acaba por afetar as populações dos insetos inimigos naturais das cochonilhas, criando uma demanda estabelecida do controle químico. Além disso, os piretróides são tóxicos para insetos benéficos, tais como abelhas e libélulas.

TRAÇA-DOS-CACHOS

O engenheiro comentou sobre a ocorrência localizada de traça-dos-cachos. Segundo o material da Agência Embrapa de Informação Tecnológica:

A traça-dos-cachos - Cryptoblabes gnidiella (Millière, 1864) (Lepidoptera pyralidae) - é um microlepidóptero que vem provocando sérios danos às cultivares de uva destinada à elaboração de vinhos e que tem atacado também, ainda que em menor proporção, cultivares para mesa. Os ovos de C. gnidiella são postos isoladamente, nos pedúnculos dos cachos ou nas folhas.

ASPIRAN BOUSCHET

Durante a visita houve a possibilidade de visitar-se uma área do cultivar Aspiran Bouschet. A Aspiran Bouschet é uma variedade de uva tinta criada em 1865 por Henri Bouschet das variedades Gros Bouschet (por sua vez, um cruzamento entre as variedades Aramon e Teinturier du Cher) e Aspiran. É um cultivar bastante tintório, sendo que já apresenta coloração nos cachos e sarmentos ainda distantes de seu auge de maturação. O líquido das bagas, mesmo imaturas, já apresenta coloração, como é possível verificar-se na figura 10.


Figura 9: Vinhedo de Aspiran Bouschet

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Figura 10: Baga de Aspiran Bouschet

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COUDERC

Ao passar por uma área de vinhas de Couderc, Bavaresco exclamou "agora sim veremos uvas". Ele se referia ao fato da Couderc ser uma vinha vigorosa propensa a atingir elevadas produções.

No Brasil, chama-se Couderc a variedade, porém ela difere da verdadeira Couderc noir. A Couderc noir é um cruzamento entre uma variedade Vitis vinifera desconhecida e Munson (também conhecido como Jaeger 70). Já a Munson é um híbrido inter-espécies criado a partir de duas espécies americanas de videira Vitis lincecumii e Vitis rupestris. A Couderc noir foi descoberta em 1886 no jardim de um chef de pastelaria chamado Contassot de Aubenas, na região de Ardèche (França). Contassot possuía plantações de Munson e quando observou as características desta nova videira, deu as sementes aos viticultores Georges Couderc e Albert Seibel que começaram a trabalhar com a variedade. A variedade cultivada no Brasil difere geneticamente da Couderc noir.


Figura 11: Carga de frutificação da Couderc

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Segundo o site da Embrapa:

Couderc 13 - introduzida na década de 1970 pela Estação Experimental de Caxias do Sul, foi difundida com relativa facilidade por ser muito rústica e produtiva. O vinho é pouco ácido e neutro em sabor, podendo ser cortado com outros vinhos comuns. É cultivada no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, sendo que resultados de pesquisa a indicam como opção também para o Sul de Minas Gerais. É uma cultivar resistente às doenças fúngicas, entretanto, apresenta baixo potencial glucométrico.

Conclusão

Por tratar-se de uma visita com certo enfoque em tratamentos fitossanitários, Bavaresco, em diversas oportunidades, deu ênfase à importância de observação do período de carência dos produtos, e ao uso exclusivo de produtos registrados para a cultura da videira. Além disso, há a preocupação do impacto das aplicações em populações de insetos benéficos, como as abelhas.

Em relação à pérola da terra, alguns cultivares de Vitis rotundifolia são resistentes ao inseto (BOTTON; COLLETA, 2010), portanto, a busca por porta-enxertos com características de resistência aos principais problemas da região devem continuar.

Falando num panorama mais generalista, o engenheiro evidenciou a participação do suco no faturamento da Cooperativa, o que traz a tona a importância do cultivo regional de uvas americanas, que por muitaz vezes recebe um olhar pejorativo por apreciadores de vinhos finos, porém possui grande impacto econômico na região da serra.

Referências

http://www.agencia.cnptia.embrapa.br/gestor/uva_de_mesa/arvore/CONT000g88nyjz902wx5ok0u5nfpm9b04rkw.html

https://sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/FontesHTML/Uva/UvaAmericanaHibridaClimaTemperado/cultivar.htm

BOTTON, M.; COLLETA, V. D. Avaliação da resistência de cultivares de vitis rotundifolia à pérolada-terra (hemiptera: Margarodidae) na região sul do brasil. Acta Sci., Agron., v. 32, n. 2, p. 213–216, 2010.